A mesma vida de quando sentou naquele banco, há poucos minutos. A mesma vida que ela gostaria de esquecer, pelo menos por um instante sequer. A mesma vida, sofrida, que parece só ter obstáculos, nunca vitórias. A única vida que ela tinha, mesmo sem se orgulhar. Mesmo sem poder escolher. A única vida que tem pra viver.
Talvez ela quisesse ter o poder de fazer passar sua dor, sua vida e sua angústia tão depressa quanto as imagens à sua janela. Aquelas imagens diversas, sem ter tempo pra refletir bem sobre elas, sem ter tempo para entendê-las e visualizar com nitidez, apenas vendo passar corrido, como que adiantando um filme e, simplesmente, parar no momento desejado.
Ou talvez ela simplesmente olhe e sinta que nada pode fazer. As lágrimas não curam. Só a faz lembrar-se da ferida aberta, que dói, que sangra, e que parece que nunca vai cicatrizar. Só molha o ferimento e impede de fechar.
A sua ferida é profunda, parece ter anos ou talvez apenas alguns minutos. As lágrimas são recentes, mas o seu olhar, as suas marcas de expressão e seu sorriso que não existe mais, são de muito tempo.
O seu olhar e expressão sofrida comove e intriga as outras pessoas a sua volta. As faz chorar por nada poder fazer, ou talvez por remorso por ter a deixado ir embora sem lhe perguntar seu estado ou ter feito algo por ela. As pessoas se identificam e choram. E sentem a mesma dor. E a entendem profundamente, pois sentem a mesma dor, assim como ela, todos os dias. E se perguntam e refletem sobre essa imagem, repetida, dia após dia, no mesmo banco e na mesma janela. Ou pelo menos isso aconteceria, caso alguém a notasse. Caso alguém percebesse a sua presença tão banal e tão insignificante.
Ela acorda todos os dias, senta no mesmo banco, na mesma janela e nada acontece. Ela viaja de costas, como que buscando resgatar algo que já foi e não volta mais. Como que esperando que sua vida regresse e ela possa reviver qualquer segundo já passado. Ela viaja de costas na esperança de que ninguém a note e que alguém se importe. Se lamenta, leva as mãos à cabeça, enxuga seu rosto, vermelho, molhado, com o semblante franzido e inchado, de tanto chorar. Enxuga o suor de sua testa e aprecia o vento. Uma brisa suave, leve, que movimenta lentamente seus cabelos, presos, como o seu choro, pra que ninguém ouça. Ela fecha seus olhos e pensa sobre tudo o que passa e ela não pode fazer voltar. Ela percebe a velocidade e fecha seus olhos a fim de esquecer. Ela fecha seus olhos e não quer ver. Mas tem que encarar. Não se pode ficar pra sempre no mesmo banco e na mesma janela.
Não há o que fazer. O sol bate à janela, mas não consegue secar suas lágrimas, nem com a ajuda do vento, suave. Ela se levanta e caminha, lentamente, meio que perdida, sem rumo certo. Ou talvez ela não queira chegar ao seu destino e adie sua chegada o máximo que puder. Mas ela não pode fugir pra sempre. E todos os dias ela irá sentar no mesmo banco e na mesma janela. E ninguém a notará chorando, enxugando as lágrimas discretas, o seu olho avermelhado e seu semblante cansado.
Nada cura a dor de um sentimento que não existe, pois ninguém mais conhece.
11-08-2010
Ao som de: Silver Stallion – Cat Power
Éste é sensacional.. e por ter sido o primeiro após um imenso periodo sem produzir, vejo como um regresso, para uma nova fase - feliz por ser a nossa fase - sou apaixonado por este retorno e mais ainda por de forma indireta ter te provocada para escreve-lo.
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