domingo, 5 de dezembro de 2010

Mesmice noturna.


Todas as noites eram sempre iguais. A mesma luz, do lado de fora, que não se apagava. A mesma dificuldade para encontrar o sono, perdido em algum lugar de seu quarto. Os mesmos pensamentos, incessantes e inquietos.



Seus pensamentos gritavam até pulsar em sua cabeça, que doía. Já não sabia mais o motivo dessa dor. Aliás, motivos era o que não lhe faltava, de modo algum.


Seus pensamentos, misturados e enlouquecidos, eram de quem não tinha o que pensar. Aqueles que cantam, recitam, sonham e conversam entre si. Pensamento que é quase sono, distraído.


Mas o sono não vinha. Sonhava acordado. Sonhava sem ter dormido. Escutava todos eles, frequentemente, excitados, escandalosos. Cantando canções e fazendo tudo ter trilha sonora.


Seus sonhos se misturavam. Sonhos antigos, sonhados há muito tempo e que ainda eram recentes. Seus sonhos se misturavam até que duvidava da realidade e do acontecimento das coisas. Pensava que tudo ia ser diferente assim que acordasse, que tudo não havia passado de um sonho, um filme ou uma ilusão qualquer.


Mas o sono não chegava. Apenas sonhava acordado. E vivia essa realidade duvidosa, em que não se sabe o que é verdade e o que não é. Em que tudo parece sonho, ilusão. E não se acorda, pois não se dorme. Apenas se ouve as canções novamente e o tempo todo. E se perde o medo da mentira.


Não existiam mais palavras. Nada e nem ninguém poderia descrever aquela estranha sensação que, além de incomodar, atormentava e doía todas as noites. E aquela luz lá fora parecia que nunca ia se apagar.


Não queria mais pensar em nada. Mas não pensar é um refúgio temporário. Não adiantava fugir. Apenas se finge a inexistência de uma coisa que já existe.


Encontrava-se só. Sozinho e perdido em seus pensamentos e sua falta de sono. Sua cama era gelada e brilhava uma luz do lado de fora, que espantava seu sono, cada vez mais.


Não havia cortinas nas janelas. Talvez se houvessem cortinas haveria sono e, quem sabe, dormir seria a melhor maneira de se confortar. Ou talvez não houvesse maneira de conforto.


Aquela solidão em que se encontrava era mais um momento de reflexão forçada. Colocar em dúvida suas próprias convicções. Ou talvez colocar a prova.


Era confuso. Pensar e repensar. Não podia decidir, não podia escolher e não podia julgar. Se sentia incapaz e só. Parecia que todo esforço a que tinha se dedicado havia sido facilmente em vão.


Seus pensamentos gritavam alto demais. Acreditava que impedindo-lhes de criar asas, arrancando-lhes toda liberdade, matando-os e os privando de viver, desse modo, eles deixariam de existir. Tolice. Era impossível dominá-los. Eles, todos eles, possuíam vida própria. E gritavam cada vez mais alto.


Já não podia agüentar aquela solidão. Aquela dor. Aquela falta de sono. Aqueles pensamentos. Aquelas canções que se repetiam. E aquela luz acesa do lado de fora.


Já não agüentava mais. Não podia agüentar aquilo se repetindo noite após noite. Era tudo tão repetitivo e constante. Já não tinha paciência. Tudo que houve um dia, havia desaparecido junto com seu sono.


Só havia duas alternativas: comprar cortinas ou fechar os olhos e dormir, de uma vez por todas.


E não havia refúgio. Qualquer refúgio seria temporário, como todas as outras vezes. A única coisa que queria de verdade era dormir e esquecer aquela luz acesa do lado de fora.


Até que seus olhos foram se fechando, lentamente, e tudo foi desaparecendo. E lá fora, a luz se apagou, pouco a pouco, até que nada mais restou a não ser o silêncio infinito daquela noite.














12-16/08/2010


Ao som de: State of Emergency - Bjork

Um comentário:

  1. O mundo vive em constante movimento e isso não podemos impedir, dá muito mais trabalho se privar da sua, aceitar as impossições do destino, aceitar tudo calado e transformar as noites em replicas eternas da noite anterior, do que deixar-se solto para voar e deixar que o movimento da vida te leve para uma nova aventura a cada dia...

    Ambos sabemos que por mais que doa torna-se livre é a unica forma de vivermos... a nossa história é a maior prova disso!

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