terça-feira, 19 de abril de 2016

CAPÍTULO TRÊS - (da continuação de um livro sem sentido)



Eu não sei porque inventei de escrever. Sei menos ainda de onde foi que surgiu a pretensão de que minhas singelas palavras interessassem a quem quer que fosse e pudessem se tornar um manuscrito um dia.
Nada sobre mim pode interessar a quem quer que seja, se nem eu mesmo consigo me interessar por quem eu fui ou sou.
Escrevo mais da necessidade de mim mesmo, de tentar me livrar dos meus pensamentos grudentos, do que da vontade de que alguém realmente leia. Muito pelo contrário, tenho um certo receio de me revelar demais nas minhas palavras, quando meu intuito era deixar tudo trancado numa gaveta, com cadeado, se possível.
Mas eu preciso escrever. Há muito tempo deixou de ser apenas meu ofício para ser a única saída que pode amenizar minhas dores corriqueiras. Aquelas que não consigo tampar com curativos. Aquelas que não consigo procurar ajuda para diagnosticá-las, com medo de estar certo nas minhas evidências. Com medo do antídoto. Com medo do gosto amargo do medicamento que viria a seguir.
Busco, então, de todas as formas que acredito serem possíveis me livrar de todos os sintomas dessa doença que me persegue, dia após dia. Me dói tudo. O corpo todo e além: todo o meu ser. As pequenas coisas que antes tinham cor, hoje já não as enxergo. O sorriso que me espera a noite já não recarrega minhas baterias, gastas e viciadas demais para somente ligar numa tomada por algumas horas.
O prazer das pequenas coisas me foi tirado no mesmo instante em que percebi que não teria mais você por perto. Nem por perto e nem distante. Não te teria mais de jeito algum. Não sei mais seu endereço. Não sei mais seu telefone. Não sei mais que cor de cabelo ou corte usa. Não sei mais reconhecer tudo aquilo que fotografei com meu olhar e que guardei na minha memória.
Chego a duvidar se você realmente existiu ou se o que eu sofro mesmo é de um quadro de esquizofrenia aguda e grave, daquelas que o paciente nem deveria estar vivendo normalmente em sociedade, pois ele não possui certeza alguma, nem sequer da sua própria existência.
Tenho medo de esquecer tudo, todas as lembranças que guardei de você, seu nome, a cor dos seus olhos, os sussurros que estavam guardados ao pé do meu ouvido. Ou pior: tenho medo de que tudo isso não tenha mesmo existido, tenha sido apenas mais um dos meus sonhos malucos, onde eu faço o que eu quero e tudo é como eu gostaria que fosse, mas não é e nem está perto de ser.
Comecei pensando em escrever sobre o amor e olha só onde eu fui parar! Já não sei mais nada, nem sobre o amor, nem sobre a realidade, nem sobre merda nenhuma. Tudo que eu sei é falar no mesmo assunto, o tempo todo, como um disco arranhado numa faixa só: VOCÊ, VOCÊ e VOCÊ.
Estou cansado de me repetir e pensei que escrevendo tudo iria embora, junto com as tuas lembranças, junto com as coisas que você levou, deixando a gaveta de baixo vazia, cheia de espaço pra eu guardar tudo aquilo que queria esquecer de você.
Perco a coragem e ao invés disso, me apego a tudo aquilo que restou, o pouco que ainda tenho, na expectativa de nunca duvidar da sua existência. Reservo tua gaveta, na esperança de que você volte um dia. Não sou capaz de guardar nada que não diga respeito a você lá dentro.
Mas a cada vez que abro, meu peito aperta e uma lágrima quer sair, pois dela sai um ventinho gelado, junto com o cheiro de pó, que é a única coisa real a que consigo sentir: o vazio da tua distância.

Tento, fracassadamente, me curar de uma doença que eu mesmo diagnostiquei e tento medicar. Sem sucesso.  Nada parece funcionar. Eu sou o meu próprio experimento de TENTATIVA DE ESQUECIMENTO DE UM AMOR QUE NÃO VAI VOLTAR.
E ao invés de tomar pílulas de amnésia, eu tomo de saudade. Ao invés de sonos de relaxamento o que eu tenho são madrugadas de insônia, pensando em você, em como você deve estar, o que deve estar fazendo, se casou, se teve filhos, se um dia vai voltar. Ao invés de jogar fora tudo sobre você o que eu faço é ir atrás de tudo que as pessoas possam publicar de notícias suas em redes sociais, para salvar numa pasta com nome falso e oculta em meu computador.  Ao invés de te esquecer, é como se hoje você estivesse ainda mais presente do que nunca.
A minha distância, o meu respeito pelas suas escolhas e minha consciência de que não devo interferir me fere e me arranha, me machuca e me pesa na consciência. Me tomo por covarde e nem sequer o último gole de uísque que me resta pode resolver isso.
A minha vontade era te procurar, dizer tudo que sinto e senti, pedir pra que volte e esqueça tudo que passou. Te dizer que eu sou a melhor escolha que podia fazer. Mas eu não posso. Não posso e estou longe de ser a melhor escolha pra qualquer pessoa que seja.
Sou nocivo a mim mesmo e a quem se aproximar de mim.
Então ao invés de te procurar eu sofro, em segredo, na ingenuidade de que transformar sentimentos em palavras possam resolver todos os problemas do mundo. Na ingenuidade em sua forma mais completa de que as palavras tenham algum sentido, se nem ao menos os meus pensamentos possuem algum. Torno-me repetitivo e humilhadamente fracassado, no propósito de escrever um texto sobre as belezas do amor.


quinta-feira, 14 de abril de 2016

CAPÍTULO DOIS - ( de um livro que não era pra ter continuação, mas de repente teve)

Eu não sou a pessoa mais infeliz do mundo, muito pelo contrário. Há muita felicidade em mim. E é nisso que eu tenho tentado me agarrar todos os dias. Mas o mais difícil não é reconhecer a felicidade, mas acreditar que eu a mereço.

A felicidade está em todo canto. Em cada pensamento que ultrapassa a minha linha de consciência e invade a minha mente, manifestando-se num olhar distante ao horizonte, perdido... A cada lembrança tua, do teu sorriso tímido e contido, das curvas do teu corpo, fora dos padrões e de uma beleza única... É como uma cena de um filme: um filtro ensolarado, em câmera lenta, um vento leve que faz seu pelos arrepiarem, formando pequenas bolinhas onde encosto minha boca e você suspira, querendo pedir para que eu pare e não pedindo absolutamente nada. Ao fundo, toca uma música que não consigo identificar, mas nós, eu e você, não falamos nada, apenas sei que existem suspiros e olhares, extremamente comprometedores, de um amor não admitido, louco para dizer um “eu te amo”, reticente, na incerteza de ser o momento certo ou não e estragar todo esse clima de romance cinematográfico.

O meu olhar, distante, embaçado, vai tomando consciência e voltando a realidade. Não existe sol da tarde, não existe vento, não existe seu cheiro, muito menos você. Só o que existe é essa sala vazia, fria e empoeirada. Nem ao menos música de fundo eu coloquei, que era pra não correr o risco de me render às tuas lembranças, já que todas as músicas da minha playlist me remetem a você. Tudo que eu queria era apenas me concentrar nas minhas obrigações, mergulhar no trabalho, sério, meticuloso e necessário.

Já não tenho mais criatividade pra dar origem a boas ideias. E menos ainda concentração para apenas executar aquilo que já sei que passou da hora de ser feito. Toda linha de raciocínio que inicio em linha reta, quando menos espero, faz uma curva perigosa que dá numa rua sem saída que é você. Todo pensamento que tenho acaba em você, de alguma forma.

Como você pôde marcar tudo a meu respeito? Todas as cores que já contemplei, todas as canções e sons que já ouvi, todos os cheiros que senti... Tudo, tudo que já tive contato...
Você quase que me parece uma doença, extremamente contagiosa, em que ainda não inventaram vacina, antídoto ou remédio pra aliviar que seja a dor da existência.
Tudo que é seu me persegue, mesmo que você nunca tivesse intenção nenhuma de que isso acontecesse. Muito pelo contrário, acho até que você acreditava que sumindo da minha vida, tudo que é seu ou foi sumiria também, na mesma hora. Mas isso não aconteceu.

Li uma vez que podemos medir o sentimento por alguém não pela presença da pessoa, mas pela ausência, pela falta que ela faz. E não quero admitir. Mas não sei que outra explicação dar a esse sentimento de vazio e destruição que toma conta de mim, todas as horas dos meus dias.

A minha fuga é a solidão, para não ter mesmo que admitir a quem quer que seja tudo aquilo que não quero admitir a mim mesmo. Mas é na minha solidão que me entrego, sem intenção, a tudo aquilo que em consciência tento escapar. É como se estivesse sonhando novamente. Não posso fugir, não posso esconder e não posso negar.

Não ouso pronunciar palavra sequer, com medo de dizer em voz alta e atrair tudo aquilo que esperava que ninguém ouvisse... Que ninguém soubesse... E que nem ao menos existisse.

Às vezes, penso que seria mais fácil se eu não existisse também, que acordasse um dia sem acordar... Que ficasse naqueles sonhos que me perseguem e me perdesse de vez... Mas isso não acontece. Abro os olhos todas as manhãs e sinto o peso do meu corpo me obrigando a voltar a realidade. Tomo um banho demorado na intenção de que, junto com a água corrente, corra também os sentimentos devastadores que são capazes de me derrubar pelo resto do dia.

Fracasso toda vez. Tudo que sou capaz de fazer é fingir um sorriso amarelo, me apoiando na gentileza dos “bom dias” oferecidos aos outros, já que a esperança do meu já se foi há muito tempo. Mas minhas sobrancelhas não negam. Meu olhar, vazio e congelado pela tristeza, permanece perdido e distante, porém tentando disfarçar tudo aquilo que enfrentarei do meu dia.

Sei que a felicidade está aqui, em algum lugar. Mas tudo a que me apego nessa ideia são as tuas lembranças, que teimo em tentar evitar, fracassando toda vez. Visto um sorriso amarelo depois do café da manhã e saio em busca de algum sentido, fazendo força pra esquecer tudo que me lembra você, tentando encontrar forças para seguir mais um dia.

Tenho certeza que a felicidade está em todo lugar. Não há motivos reais para essa tristeza que me toma. E isso faz com que a culpa em sentir tua ausência se transforme numa mochila pesada demais para carregar nas costas todos os dias, ao sair.  Busco a solidão para amenizar, ou ao menos para cair vez ou outra, se o peso for demais para aguentar.

Mas não é possível enganar a si mesmo quando se está sozinho, mas não tenho outra alternativa que não tentar, todos os dias após o café.


segunda-feira, 4 de abril de 2016

CAPÍTULO UM - (de um livro que nunca terá continuação, mas que ainda faz sentido)


Eu nunca pensei que fosse capaz de falar de amor.
Tantas coisas que eu nunca pensei que passariam pela minha cabeça hoje pesam tanto!
Pesam do tamanho de uma lembrança, daquelas que a gente tenta esquecer e já é tarde demais... Pesam como uma pessoa que insiste, por orgulho ou teimosia, se afastar de nossas vidas, parecendo que nunca vai voltar.
Mas o mundo dá muitas voltas. E rápido demais.
Seria ingenuidade minha, talvez, acreditar ser capaz de ignorar tudo isso e viver em paz. A paz é inalcançável.  
Cheguei a essa conclusão numa madrugada dessas.
Há algum tempo já não as uso mais para dormir.
Estou pensando em desistir. Talvez as madrugadas, sejam lá por quem tenham sido criadas, não tenham sido feitas com esse propósito. Desconfio que nós, seres humanos, carentes e problemáticos, teimamos em ignorar as evidências e tentamos usá-las pra suprir um cansaço que é físico. Fisicamente manifestado pela nossa inquietação mental constante.
E isso cansa. E como cansa!
E eu canso o tempo todo.
Às vezes, imagino que sou capaz de desligar meus pensamentos, só por um instante, só por uma piscada de 3 segundos, que é o máximo possível antes de ser considerado um cochilo. Imagino que quando desligo esses pensamentos tenho a chance de mudá-los de lugar dentro da minha cabeça, como uma cômoda com muitas gavetas, em que, a cada vez, a cada piscada, o pensamento vai descendo de gaveta até ficar na última, a mais difícil de abrir, a que esqueço que existe vez ou outra.
Doce ilusão. Nem ao menos sou capaz de desligar-me dos meus pensamentos e, ainda que fosse, seria ilusão ainda maior pensar que conseguiria evitar a tal gaveta de baixo.
Acho que foi lá que eu guardei o tal do amor, com a minha estúpida ingenuidade, novamente, de tentar esquecê-lo.
Se nem ao menos sou capaz de desligar os meus pensamentos, por 3 segundos que sejam, quem dirá esquecer um amor.
Não a ideia de amor que muitos pregam em felicidades manipuladas socialmente. Não, é de outro amor que eu estou falando.
Um amor que, nos tempos de hoje, sou covarde em admitir. Parece piegas demais!
Em tempos onde o “amor fast food” resplandece no “coração” das pessoas, bate um constrangimento em admitir o amor e as fraquezas que o acompanham. As pessoas se pintam tão mais fortes nisso do eu me vejo capaz.
Não sei onde está o equívoco, se na superficialidade do amor delas ou na intensidade brega do meu.
O meu amor acelera meus batimentos cardíacos e desacelera a minha respiração, cada vez que escuto sua voz, ou cada vez que te leio, direta ou indiretamente, o que hoje é mais comum. Quando eu te vejo, então! Não sei se respiro ou se concentro todas as minhas energias em disfarçar o amor que eu sinto, que parece ser grande demais para qualquer ser humano aguentar. Acho que te sufocaria. Então, sempre tento contê-lo.
Mais uma doce ilusão.
Não pense você que eu o escondo somente por covardia minha não. É também. Mas muito mais pelo medo do sufocamento que posso lhe proporcionar. Por medo da tua (não) correspondência. Pelo teu abandono. Pelas tuas palavras enfáticas e aquelas não ditas que eu li nas entrelinhas, que me fizeram chegar a conclusão de que o amor que eu sinto é mesmo impossível. Ou melhor, somente possível pra mim, nos meus sonhos, na minha imaginação... Nas minhas doces ilusões. Ou naqueles sonhos que escondo de você e não te conto, mas que são recorrentes. Cada vez mais recorrentes.
Nos meus sonhos o dia é nublado e venta muito. Quase não consigo diferenciar dia e noite. O frio é quase congelante. Eu tento te aquecer, mas nunca sou capaz, pois o frio já tomou conta de mim também, por inteiro.
Eu acordo na esperança de que tudo seja só um sonho e que você esteja ao meu lado, encostando o seu corpo quente ao meu e a sua respiração se misturando a minha.
Mas isso nunca acontece. Isso nunca mais vai acontecer.
E meu sonho fica cada vez mais próximo da realidade, como se a cada vez que ele viesse me visitar os planos, sonho e realidade, se invertessem e a minha realidade fosse cada vez mais congelante, o ar cada vez mais rarefeito e o meu coração cada vez mais apertado pela consciência da tua ausência, da tua distância.
Abro a geladeira 1230 vezes, como se procurasse nela as respostas para as minhas perguntas “madrugais”. Não encontro. Nem as respostas, nem nada que me apeteça.
Li que doces liberam substâncias que simulam a felicidade. Comigo não funciona. Acho até que parei de produzir essas tais substâncias. O meu cérebro já não funciona mais como antes. Meus pensamentos parecem mais lerdos. Parecem não sair do lugar. Parecem estar sempre no mesmo lugar. No mesmo pensamento. Sempre em você. Por mais que eu queira evitar.

Você roubou de mim a minha paz. E levou com você todo o meu estoque de substâncias da felicidade, todos os doces que tinham na minha geladeira.