quinta-feira, 14 de abril de 2016

CAPÍTULO DOIS - ( de um livro que não era pra ter continuação, mas de repente teve)

Eu não sou a pessoa mais infeliz do mundo, muito pelo contrário. Há muita felicidade em mim. E é nisso que eu tenho tentado me agarrar todos os dias. Mas o mais difícil não é reconhecer a felicidade, mas acreditar que eu a mereço.

A felicidade está em todo canto. Em cada pensamento que ultrapassa a minha linha de consciência e invade a minha mente, manifestando-se num olhar distante ao horizonte, perdido... A cada lembrança tua, do teu sorriso tímido e contido, das curvas do teu corpo, fora dos padrões e de uma beleza única... É como uma cena de um filme: um filtro ensolarado, em câmera lenta, um vento leve que faz seu pelos arrepiarem, formando pequenas bolinhas onde encosto minha boca e você suspira, querendo pedir para que eu pare e não pedindo absolutamente nada. Ao fundo, toca uma música que não consigo identificar, mas nós, eu e você, não falamos nada, apenas sei que existem suspiros e olhares, extremamente comprometedores, de um amor não admitido, louco para dizer um “eu te amo”, reticente, na incerteza de ser o momento certo ou não e estragar todo esse clima de romance cinematográfico.

O meu olhar, distante, embaçado, vai tomando consciência e voltando a realidade. Não existe sol da tarde, não existe vento, não existe seu cheiro, muito menos você. Só o que existe é essa sala vazia, fria e empoeirada. Nem ao menos música de fundo eu coloquei, que era pra não correr o risco de me render às tuas lembranças, já que todas as músicas da minha playlist me remetem a você. Tudo que eu queria era apenas me concentrar nas minhas obrigações, mergulhar no trabalho, sério, meticuloso e necessário.

Já não tenho mais criatividade pra dar origem a boas ideias. E menos ainda concentração para apenas executar aquilo que já sei que passou da hora de ser feito. Toda linha de raciocínio que inicio em linha reta, quando menos espero, faz uma curva perigosa que dá numa rua sem saída que é você. Todo pensamento que tenho acaba em você, de alguma forma.

Como você pôde marcar tudo a meu respeito? Todas as cores que já contemplei, todas as canções e sons que já ouvi, todos os cheiros que senti... Tudo, tudo que já tive contato...
Você quase que me parece uma doença, extremamente contagiosa, em que ainda não inventaram vacina, antídoto ou remédio pra aliviar que seja a dor da existência.
Tudo que é seu me persegue, mesmo que você nunca tivesse intenção nenhuma de que isso acontecesse. Muito pelo contrário, acho até que você acreditava que sumindo da minha vida, tudo que é seu ou foi sumiria também, na mesma hora. Mas isso não aconteceu.

Li uma vez que podemos medir o sentimento por alguém não pela presença da pessoa, mas pela ausência, pela falta que ela faz. E não quero admitir. Mas não sei que outra explicação dar a esse sentimento de vazio e destruição que toma conta de mim, todas as horas dos meus dias.

A minha fuga é a solidão, para não ter mesmo que admitir a quem quer que seja tudo aquilo que não quero admitir a mim mesmo. Mas é na minha solidão que me entrego, sem intenção, a tudo aquilo que em consciência tento escapar. É como se estivesse sonhando novamente. Não posso fugir, não posso esconder e não posso negar.

Não ouso pronunciar palavra sequer, com medo de dizer em voz alta e atrair tudo aquilo que esperava que ninguém ouvisse... Que ninguém soubesse... E que nem ao menos existisse.

Às vezes, penso que seria mais fácil se eu não existisse também, que acordasse um dia sem acordar... Que ficasse naqueles sonhos que me perseguem e me perdesse de vez... Mas isso não acontece. Abro os olhos todas as manhãs e sinto o peso do meu corpo me obrigando a voltar a realidade. Tomo um banho demorado na intenção de que, junto com a água corrente, corra também os sentimentos devastadores que são capazes de me derrubar pelo resto do dia.

Fracasso toda vez. Tudo que sou capaz de fazer é fingir um sorriso amarelo, me apoiando na gentileza dos “bom dias” oferecidos aos outros, já que a esperança do meu já se foi há muito tempo. Mas minhas sobrancelhas não negam. Meu olhar, vazio e congelado pela tristeza, permanece perdido e distante, porém tentando disfarçar tudo aquilo que enfrentarei do meu dia.

Sei que a felicidade está aqui, em algum lugar. Mas tudo a que me apego nessa ideia são as tuas lembranças, que teimo em tentar evitar, fracassando toda vez. Visto um sorriso amarelo depois do café da manhã e saio em busca de algum sentido, fazendo força pra esquecer tudo que me lembra você, tentando encontrar forças para seguir mais um dia.

Tenho certeza que a felicidade está em todo lugar. Não há motivos reais para essa tristeza que me toma. E isso faz com que a culpa em sentir tua ausência se transforme numa mochila pesada demais para carregar nas costas todos os dias, ao sair.  Busco a solidão para amenizar, ou ao menos para cair vez ou outra, se o peso for demais para aguentar.

Mas não é possível enganar a si mesmo quando se está sozinho, mas não tenho outra alternativa que não tentar, todos os dias após o café.


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